quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Vida Lenta

Tenho desperdiçado tempo atrás de explicações;
Sobre o que talvez pudesse ter prorrogado o ponto final do nosso conto,
e sobre que nos custou a brevidade interrompida;
Buscando motivos que eu pudesse responsabilizar e então, dar de ombros;
Como se nosso fracasso não tivesse dependido de nós,
nem das nossas cabeças bêbadas cheias de planos vagos.
Não teve frieza.
Pelo contrário, acabamos queimando rápido e com uma intensidade devastadora;
Que ironicamente, nos devastou.
E como foi bom...
Um salto em queda livre, onde fomos rei e rainha do (nosso) mundo,
assistindo a vida acontecer de forma assustadora e sublime.
Sempre soubemos que precisaríamos de mais, mas era tudo o que tínhamos.
Alguns poucos segundos para olharmos um ao outro como nunca antes p'ra ninguém;
E assim fizemos.
Uma vida de segundos, que valeu muito mais que anos inteiros.
Estilhaçados no chão, nos tornamos cegos a todo o resto;
Perambulando pela vida que agora, passa devagar;
Devagar demais.

Foto: Pedro Costa

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Um Veneno Bom

Por mais que o chão se abra sob meus pés,
não me importarei com o silêncio, nem com a falta de luz.
Já fui espantalho em desertos;
Já garimpei lama, em vão;
P'ra te encontrar.
E nada pode ser pior,
nem mesmo o céu a desabar sobre a minha cabeça;
Enquanto você vem me procurar,
somente quando não tem nada a perder;
Com o poder de causar ou fazer parar a dor;
Me oferecendo o antídoto venenoso da tua atenção momentânea;
Drenando de mim toda e qualquer palavra que você queira ouvir;
De riso sarcástico e olhar desdenhoso;
Tendo-me, sem fazer-se parte.
Sou obrigado a sobreviver à todas as vezes
que você destrói meu mundo.
No silêncio e na escuridão;
Sem a luz da tua ausência.
Nem sei mais como começamos,
mas não consigo querer fazer parar.

Foto: Gustavo Almeida

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Vitrine

Queria que a tua presença finalmente,
pudesse me deixar em paz;
Mas como você bem sabe,
adoro este caos sublime que não hesita em me rasgar ao meio.
Fiz de você meu tormento predileto,
que insisto em sempre imaginar estar depois da próxima curva,
e da próxima, depois desta.
Com um espaço na sua vida que eu não posso ocupar;
Te vejo chorar.
Te observo através de uma vitrine feita da tela de um celular;
Hesito em falar...  e calo.
Te vejo rindo, abraçada a demônios,
seguindo os passos teus, num caminho que não ouso percorrer.
E você chora, por baixo da tua superfície de cabelos e batom vermelhos;
E nem permite que eu te odeie,
por me atormentar com essa sensação de impotência.
Por me manter alheio à lágrimas que você não percebe cair;
Não percebe, por escolher continuar a caminhar na chuva.

Foto: Renato Caio

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Tapete

Esta realidade parece não mais, ser capaz de me alcançar;
Jogado e entregue, aos teus olhos me faço serviçal;
Invisível enquanto você passa, baixo demais p'ra te fazer tropeçar.
Te observo bater a porta, deixando-me para trás,
e limpando teus pés, sempre te recebo de volta.
Me fortaleço na tua soberba e absorvo todo o teu desdém;
Não invejo o descaso que você distribui à sua volta;
Nem esse forçado ar de segurança sob a tua maquiagem.
Sou menos que um figurante do teu cenário hostil;
Deixando um buraco na fotografia quando saio de cena.
Enquanto você aprecia a liberdade da tua cela,
eu refino meu gosto, meu toque e meus movimentos pelo ar;
Eu te alcanço, p'ra perceber enfim, que não há nada em você,
p'ra mim.

Modelo: Renata

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Tão Perto

Deixando as preocupações de lado;
Tornei a chamar-te;
Com uma desculpa de ter sentido falta de algum livro,
certamente esquecido sobre a mesa da tua sala... ou na cabeceira da tua cama.
Tentamos quebrar a tensão com algumas piadas e juntos,
forçamos risadas que antes eram espontâneas.
Um breve silêncio na fala, um suspiro deste lado da linha e uma pergunta:
-Você está bem?
Eu sempre soube da tua vontade em compartilhar do peso que carrego;
Sempre soube que se entregaria, se fosse necessário;
E que isso te tornaria miseravelmente infeliz.
Hoje, você está bem.
Sei que chorou, quando quis;
Sei que morreu um pouco, e lentamente.
Eu hoje, posso sentir-te fora de mim;
Sei que ainda me observa de longe;
Como se fosse para reafirmar à si mesma que foi melhor assim;
Que desistir foi a escolha acertada.
Convence-se de que, se tivesse ficado, estaria arrependida.
Do lado de cá da linha, esqueço do livro;
Quero apenas te ouvir falar;
De tão longe, ainda estando tão perto.

Foto: Fabiana Saar

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Sobreviva(se)

O momento chegou.
Você deixou-se tomar pela ira e fez dela,
o meu flagelo.
Fomos sinceros como nunca havíamos sido;
Não tive saídas a te oferecer.
Você, encolhida, não me permitiu pena;
Sequer compaixão.
Suplicou por uma crueldade que seria como álcool nas tuas feridas.
E você sobreviveu.
Gritou, debateu-se... e suportou a dor bravamente.
Não necessita mais dos meus dedos,
nem da minha língua adentrando o teu mundo.
Tornou-se sua, e só.
Recompôs-se, reergueu-se.
Aniquilou as minhas memórias da forma que determinou ser mais eficaz.
Escolheu por si só a liberdade dos sentidos... e da carne.
Doou-se e teve-se de volta.
Orgulhou-se das lágrimas derramadas e fez delas um troféu;
Venceu-se.
Agora, percebe que não havia saída melhor do que nenhuma;
Nenhuma saída.
Sufocou tudo em si;
E por isso, agora, tens tudo.

Modelo: Angélica

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Fragilidade

Após morrer um punhado de vezes,
a dor deixa de fazer sentido;
Deixa de se fazer sentida.
Ao contrário do que dizem, 
a morte da esperança é a melhor de todas.
Faz cessar a tortura da espera e nos obriga a virar a página.
Costurar as feridas torna-se uma ocupação,
quase que um esporte;
Nos mantém em forma no que tange ao quê realmente importa.
No admirável talento na arte da sobrevivência.
E de nada nos serve a fragilidade da esperança por dias de sol;
Enquanto o gelo ainda insistir em nos petrificar.

Foto: Desconhecido

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Pregado

Nos formamos através de pedaços recolhidos com o passar do tempo;
Juntando partes que nem se encaixavam tão bem,
mas nós as sustentamos.
Não é a perfeição que nos move,
mas os espaços que nos permitem vazar as partes nossas que preferimos abandonar.
No final, nos reencontramos no calor e nos arrepios;
E tudo fica bem...  até esse bem nos enjoar.
Nos fazer explodir tudo mais algumas vezes,
apenas para nos destruir um pouco mais.
Frente a frente;
Com uma das mãos pregada na cruz;
A outra estendida, segurando a tua;
De leve, e se desvencilhando à medida que o passo muda;
Até você decidir correr,
e eu, preferir manter-me parado.
Pregado.

Foto: Desconhecido

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Estímulo Raro

Esta infeliz coincidência de saltar no momento inexato;
A consequência da queda inevitável e o barulho dos ossos quebrando.
Você passou, eu titubeei e perdi o tempo.
Talvez fosse o copo e o cigarro que ocupavam as minhas mãos;
Talvez o teu cheiro tenha afetado as minhas reações;
A hipnose dos teus movimentos pelo ar...
Você.
Um quadro vivo em uma parede cinza, já desbotada;
Obrigando-me a te notar e ainda,
ser impelido a me jogar para você;
Como um prato rotineiro a ser devorado sem apreço algum;
Incapaz de me fazer iguaria.
Não que me preocupem as queixas,
nem qualquer pretensão de ser feliz.
O que incomoda, é ter que recolher os estímulos,
que já se fazem tão raros.

Foto: Luís Mendonça

sábado, 23 de maio de 2015

Cheiro de Fumaça

Me pego te procurando pela casa;
Fingindo que você está na cozinha,
ou no banheiro, tomando um banho quente.
Não sei ao certo o que houve;
Simplesmente fui acordado pela tua ausência,
e me senti em parte, preso.
Escravo da lembrança do teu cheiro pelo ar;
Do ritmo que dávamos àquela música de voz e violão.
Essas areias do tempo que correm rápido demais;
Nos fogem por entre os dedos e caem no passado,
que agora contemplamos do alto,
nos afastando.
O vento chega e faz tudo desaparecer.
Só me resta um copo a ser enchido,
e ninguém mais me observa fumar;
De soslaio e desviando quando eu viro;
Com um sorriso tímido e uma pele fácil de arrepiar.
A lembrança neste caso, me dá algumas possibilidades;
Como ficar bêbado rápido,
e continuar fingindo que você está por aí,
de alguma forma, ao meu redor.


Photo: Chris Thomas

quinta-feira, 7 de maio de 2015

Me Vendo à Ti

Te persigo e te persisto;
Meus dedos adentram tua carne;
Você se livra, devidamente marcada;
E ri de mim.
Usa tuas curvas para me distrair,
e fazer com que eu me perca;
E ri de mim.
Retribuo, deixando meus caninos a mostra.
Te vejo sem cor e prefiro assim;
Me ponho a lavar-te, a despir-te de toda inocência;
Para contemplar o meu anseio envolto em lençóis.
Meus dentes rangem, tremem e rasgam;
Você sangra... e ri de mim.
Me intoxica e me deixa a debater-me só.
Me vendo à ti por um preço baixo;
Um punhado de sonhos desperdiçados,
talvez uma vida inteira que não vale qualquer propósito.
Você a rir, se deixa engolir;
E eu te regurgito, só para te comer mais uma vez;
E mais uma vez;
E mais uma vez.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Me Faço Meu

Me seria um alívio ao menos, saber o que pensar;
Te sentir andando pelo quarto, te olhar,
e não te ver.
Te seguir pelo cheiro;
Descobrindo o que você comeu no café da manhã.
Te brindo com uma apatia que respeita os limites da conveniência.
Apago a luz.
Deixo-te petrificar no frio;
Tremendo, abraçada a indiferença que te dá tanto orgulho;
Que te faz sentir-se tua,
e só tua.
No calor do meu cigarro, me faço ausente;
Me faço encomenda com erro no destinatário;
Me faço meu.

Foto: Luis Lopes Silva

terça-feira, 28 de abril de 2015

Eu Sei e Imagino

Eu sei que há dias em que você acorda,
imaginando-se em outro lugar, onde poderia estar.
Eu sei que você revive em pensamento,
todas as escolhas impostas, as decisões que te obrigaram a tomar.
Eu sei das tuas dúvidas;
Do eco da hesitação que ainda te aflige;
Do desespero momentâneo sentido tantas vezes,
como o fôlego tomado antes do mergulho.
Eu sei que o tempo é o seu carrasco,
que te executa sem dar ouvidos ao teu clamor;
E eu sei que você clama...
Por desejar a certeza de ter escolhido a melhor estrada,
dentre tantas encruzilhadas que você encontrou...  e passou;
De tantos caminhos que você abriu mão.
Eu sei que você não se deixa cair;
E sei do preço que você paga por isso.
Eu sei também das tuas glórias,
Do quanto valeu a pena ter seguido sem olhar pra trás;
Sem ver os corpos caídos de quem não foi capaz de te acompanhar.
Eu sei da tua sorte.
E eu sei da minha dor,
de nunca ter escolhido um caminho que me levasse a te encontrar.
Eu sei do preço que pago, sem nunca ter sido cobrado;
De não ter vivido contigo;
De não saber, mas imaginar, que talvez, você possa sim,
existir.

Foto: Pedro Albuqeurque

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Não Fique

Me livro dos padrões;
Saltando em queda livre para abraçar algum impacto;
Em busca de um lugar para aprisionar as lembranças;
Exalando a raiva em forma de suor;
Escolhendo amigos pela graduação alcoólica;
Perdendo dinheiro...  e a cabeça.
Sem cogitar uma nova tentativa;
Nem mesmo enfraquecendo pela nociva lembrança;
Mantendo as ruínas do mundo presas do lado de fora.
Não espero, nem peço para esperar;
Nem ligar, nem crescer, nem mesmo cair do céu;
Nem ficar.
Entretanto, você permanece comigo;
Nesta maravilhosa lembrança,
Que me faz tão mal.

Modelo: Renata


segunda-feira, 6 de abril de 2015

O Silêncio do Final

Não falo sobre as verdades da vida de forma profunda;
Ao invés, eu as vivo;
Tenho dado minha carne às lâminas mais afiadas que encontrei pelo caminho;
Às mãos mais ásperas.
Busquei desviar da insensibilidade;
Às vezes sem sucesso;
Vi-me obrigado a buscar uma anestesia em mentiras levianas;
Desviando de olhares e me esquivando de promessas.
Não quis, nunca.
Nem sequer possuo quem testemunhe a meu favor;
Aceitei as sentenças e cumpri a pena de cada uma delas.
Não tenho dívidas.
Olhando por cima do ombro, vejo histórias interrompidas,
olhares baixos e lábios trêmulos;
Silêncios transformados em pontos finais.
Assim como eu, um personagem esvaecido;
Um silêncio súbito colocado em histórias sem final.

Foto: Pixel Eye

segunda-feira, 30 de março de 2015

Perdas Sem Nome

A fumaça se dissipa no campo de batalha;
Uma trégua para recolher os mortos;
Tempo de estancar o sangue e tentar reerguer a cabeça.
Pensamos e erramos em tudo;
Perdemos.
Somos vidro, quebramos e nos cortamos mesmo ao nos recolher;
Obrigados a ignorar todo suor e sangue desperdiçado;
Perdemos pedaços que serão encontrados por outro alguém;
Que talvez faça com eles um belo colar,
a ser exibido à quem desconhece a nossa dor.
Lamentamos, por não sentirem como sentimos;
Por não carregarmos em nós essa indiferença que parece ser tão útil;
Tão simples e prática.
Ao invés, nos importamos com o que sequer nos vê.
E assim, partimos para novas batalhas;
E continuamos a ser nada e ninguém.

Foto: Manuel Galrinho

terça-feira, 24 de março de 2015

As Piores Decisões

Juro que não quero pensar,
mas sinto explodir.
Se não somos meros produtos das nossas piores escolhas...
Baseadas em impressões superficiais,
pagamos caro pela incompetência em conhecer a nós mesmos,
tão mal.
Em nunca saber o que esperar;
Nem fazer.
Desenhamos febres e jardins floridos em telas de outrem,
que decidirá o que fazer com elas,
independente de nossa vontade.
Leiloamos nosso carisma.
Leva quem oferecer mais,
independente de qualquer merecimento.
Nossas satisfações já valem tão pouco;
Nos livrar de tudo, é mais uma delas.
Escolhemos nos doar, sem que ninguém peça;
Nem espere que possamos ficar;
Querer ficar.
As mais raras obras;
Feitas de toques, olhares e suspiros;
Deterioradas por preocupações e incertezas;
Estas também, escolhidas.

Foto: Filipe Correia

quarta-feira, 18 de março de 2015

Insuficiência

O que antes estava entre meus dentes,
agora nem meus dedos conseguem alcançar;
E nada é capaz de se fazer suficiente.
Não é o que digo, mas o que faço, que me distancia do que quero.
Quero que seja real, esse teu desejo;
Como quero não ser um estranho para você;
Quero que sejamos uma verdade;
E só.
Impreciso, involuntário, frio e insensível;
Cego e surdo ao que se mostra;
Incapaz de se fazer suficiente.
Te faço cruzar os braços, fechar a porta e duvidar;
Te espreito com o pensamento e passo a te observar por dentro;
Podendo ver tudo o que você precisa;
E o que por agora, apenas não sou.
Faço-me o teu redor;
E não satisfaço.
Sou o que sou, para sempre, vivo ou morto;
E sou para você.
E você é um sonho, dentro do meu pesadelo particular.

Foto: Antonio Jorge Nunes

quarta-feira, 4 de março de 2015

Um Calor de Inverno

Lamentavelmente, sou incapaz de me importar;
De sentir, por mais que eu queira.
Me vejo cercado;
Acuado dentro da minha própria cela;
E tudo parece, encolher.
A fina luz que tenta me alcançar,
se perde em meio a poeira e fumaça;
Nem o vento, parece ainda soprar.
E por mais que eu tente;
Por mais que eu range os dentes pelo esforço;
A vontade , a força, não alcança a cura.
Como uma mosca dourada que brilha na minha frente,
mas some, quando a tento segurar nas mãos.
E o único caminho que se mostra,
é o adormecer.
Te transformo num calor de inverno;
Frágil e com a partida marcada para breve;
Te silencio na memória;
Mas ainda e sempre,
te carrego no meu bolso.

Photo: Jovelino Matos Almeida

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Manhã Esquecida

A hesitação não me é inerente;
Tampouco o receio, ou o tremor no dedo antes de puxar o gatilho;
Sou a soma das diferenças do teu mundo;
O que você desconhece e de certa forma, anseia.
O tédio nos desregula;
Nos torna frios e ainda, empoeirados.
Aguardamos um acaso voraz, que nos aponte outra direção;
Uma que seja digna de nossos reinos todos e inteiros;
Entregamos.
Entre promessas cumpridas e promessas esquecidas;
Rolamos terra abaixo, olhando um céu ausente da memória;
Nas horas modernas atravessadas depressa e sem respirar;
Sem palavras doces por falta de tempo;
Corro para ti e te envolvo,
num abraço frio e vazio;
Mas suficiente.
Não há necessidade maior do que a vontade;
E essa vontade simplesmente, se faz escassa.
Nosso final feliz se dissolve nesta escassez;
De hoje, apenas.
Amanhã, não haverá falta que se faça notar.
Não haverá sequer, amanhã.

Photo: Manuel Galrinho

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Entrega

Assim como o fogo, você também me queima sem saber;
Me aquece quando te convém ao retornar de mais uma, 
de tantas guerras;
Trazendo consigo algum tipo de paraíso;
Que eu aceito sem a certeza de merecer.
Me entretenho com os souvenirs do campo de batalha;
Sem noção do sangue que escorreu;
Necessariamente.
A tua sombra, sequer sou capaz de perceber;
E nem em mim, nem em você, sou capaz de ler o que há de errado nisso tudo.
Um olhar, um silêncio e nada mais.
Volto à minha cabeça,
lotada de sonhos deixados de lado;
Na memória, sou levado à lugares que me fazem sentir-me em casa;
E eles são muitos.
Cada um com seu lado especial;
Com suas batalhas necessárias para serem conquistados;
Com sua parcela de dor, sangue, suor e pólvora.
Como você, também fiz meus caminhos de retorno;
Carregando souvenirs que nem sempre te entreguei.
E nunca soube da razão disso.
Mas são para ti, recolhidos e gentilmente lavados;
Mais importantes para mim, menos para ti.
Eu continuo, como o inverno;
Que te gela sem saber;
Sem querer, perceber.
A viver um sonho sem medo do abandono;
A sentir-me em casa, sem a falta de outro lar.


quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

A Inocência deixada para depois

Conservar a inocência é um arte delicada;
Como crer que seja possível abraçar uma tempestade,
envolvendo-a em braços magros;
Na cândida esperança de não ser estraçalhado,
deixado sozinho para reaver o sol.
Queria saber explicar como se pensa nisso,
para talvez, não mais pensar sozinho.
Quando o pensar acompanha o caminhar;
E tanto um quanto o outro, mesmo acompanhado, se faz sozinho.
Sempre, ainda e apesar.
Como respirar, sangrar e sentir dor.
A inocência tende a dar lugar ao autoconhecimento,
à habilidade de manipular as próprias tragédias;
A busca consciente pelo inalcançável.
Mas perde-se muito sentido de coisas pequenas;
E o vento, o calor na pele, nem se faz notar mais;
O mundo fica estreito, mais sério e pontiagudo;
E a idade chega.
Sente-se orgulho do muro construído e nos proibimos de pensar no que ficou do outro lado.
A inocência perdida no tempo,
na obrigação de solucionar problemas;
Se torna efêmera.
A deixamos para os que estão por vir;
Para que a vivenciem por nós, 
que a façam valer a pena.
E estes, a deixarão para os que virão depois.
Assim, mantemos a inocência aprisionada,
garantindo à nós mesmos o direito de cultivar a infelicidade,
à nossa maneira.