segunda-feira, 16 de abril de 2012

Esquecimento

Queima sem ser fogo;
Sufoca, tudo e a todo momento;
De natureza indômita,
Só destrói, deliberadamente.
Suporto, sangrando;
Agrado, sangrando;
Ouço, sangrando;
E permaneço inerte.
Não por vontade, mas por devoção.
Tão nociva quanto o próprio esfriar da carne;
Padeço, ao prazer de quem assiste;
Inerte, benevolente, frio a olhos e ouvidos.
Drenado de toda vaidade pela artificial sensatez;
Tomado de culpa por um "se não tivesse..."
Como o disparar desastroso percebido tarde demais.
Num espetáculo oferecido a olhos cegos e insensíveis;
Padeço, de boa vontade, antes do cair das cortinas;
Guiado por mão alguma;
Dirigido às entranhas da dor;
Na ingênua busca pelo esquecimento;
Não por vontade, mas por razão;
Precedida por um triste abrir de olhos;
E padeço, ao prazer de quem assiste.

;.
Foto: Maria Avelino

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Nada mais, de Mim

Se dar demais é deveras um erro;
De todos, creio ser o mais inoportuno.
Não me chame de volta;
Este é o lugar onde não devo estar;
Não devo me permitir ir até aí.
Por ter me alimentado tanto de você;
Dei à ti tudo o que fui, e mais;
Me envenenei consumindo-te;
Me entreguei ao gosto amargo,
Insensível à tudo.
Enquanto isso, você me preenchia com uma falsa paz;
Enchia minhas veias com sonhos frágeis...  frágeis demais!
Segurando minha cabeça em delírios e afagos;
Com olhos calmos e beijos levianos;
Carregando-me...
Peguei demais de você para mim.
Não percebi que era eu quem se entregava;
Não percebi meus restos fluindo para você.
E você, em sua fome voraz, não permitiu sobrar nada;
Nada de mim.

Foto: José Magalhães